20 de dezembro de 2017

Espelho


Para muitos o corpo é apenas uma casca, algo banal e sem importância. É comum entre as pessoas que acharam ou deram algum significado às suas vidas pensar dessa forma. Mas e quem não conseguiu?

Quem parece viver num limbo, não se reconhece ao se olhar num espelho e sempre vê o tempo passar e nenhuma mudança positiva. Perder a noção de tempo em certos momentos quando você se pega olhando para uma foto e se perdendo no além, imaginando como tudo poderia ser diferente.

Eu me olho no espelho e vejo alguém que não parece ser eu. Às vezes não consigo nem olhar e encarar a figura que aparece. É como se eu preferisse que nada aparecesse, e que fosse apenas um vazio, como um fantasma. Todas as noites, antes de dormir, observo um desenho que é um reflexo perfeito daquilo que eu gostaria de ser, daria tudo por isso, mas nada pode tornar possível.

Olho para baixo e a sensação que tenho é a de ter um óculos VR colado no meu rosto, distorcendo a realidade daquilo que devia ser real. A forma como as pessoas me tratam é a forma como me veem. Não importa o quão bem eu me vista ou quantas cirurgias faça, para elas eu nunca vou ser o que sou. É cruel. A vontade que fica é a de passar o dia inteiro dormindo, em coma.

Todo mundo diz que isso é depressão, que eu preciso fazer tratamento, mas eu sempre pergunto: por quê? Por que eu deveria? Nem um simples emprego de caixa de loja eu consigo, pois o entrevistador sequer tem a ouvir o que eu tenho a dizer. Prefere não correr o risco de ter clientes reclamando da minha presença e perdendo a freguesia. É foda ter que conviver tendo como única certeza como fonte de renda a prostituição, algo que eu prefiro morrer do ter que ter que me rebaixar a tal ponto. É essa imagem que as pessoas têm de mim, inclusive o meu próprio pai.

Quando assisti San Junipero, vi a transferência da consciência para uma realidade virtual como uma das únicas formas de ser capaz de dar algum sentido a vida.

Quando joguei Fallout 4, não me importei em pensar que poderia transferir minha consciência para um corpo sintético robótico, indistinguível de um corpo humano, como se fosse um clone.

Não me importaria em ser ou fazer parte de uma máquina, pois é como se eu já fosse uma.

Quando vi a cena do suicídio da Hannah em 13 Reasons Why, não consegui mais esquecer. Olho para os meus braços e penso que não sou capaz de lidar com a dor. Não sou forte o bastante nem para morrer, mesmo que passe horas pensando nisso.

Mas quem se importa? Para o mundo, eu sou só uma piada mesmo.

0 comentários:

Postar um comentário